4 de março de 2007

FOLHAS COM DATAS

Nada de novo.
Sorrio de ver tudo vazio.
Agora já não penso por ninguém; nem sequer me ocupo a procurar palavras. Mais ou menos depressa, uma corrente flui dentro de mim, mas não retenho nada, deixo andar. A maior parte das vezes como não se prendem palavras, os meus pensamentos ficam em estado de nevoeiro. Desenham formas vagas e engraçadas, depois imergem e esqueço-me logo deles.
Que execrável testemunha se seria nestes casos?! Mas não se perde nada, em compensação, de quanto é inverosímil, de tudo enquanto , nos cafés, não se poderia acreditar. Por exemplo, sábado à tarde, eram umas quatro horas, pelas tábuas que servem de passeio, uma mulherzinha corria às recuadas, a rir, dizendo adeus com um lenço. Nada disto é muito original; nunca recusei estas emoções inofensivas; pelo contrário. Para as sentir basta ficarmos sózinhos um momento, só o preciso para nos desembaraçarmos, na altura oportuna, da verosimilhança. Acho que não se pode manter a solidão quietinha no seu lugar.
É tarde de mais, não me refugio entre os que me cercam, senão dariam-me palmadinhas nas costas, dir-me-iam: "Então o que é que tem este copo de cerveja? É com todos os outros. Biselado, com uma asa, tem gravado um escudozinho com uma pá, e por cima do escudo está escrito spatenbräu" Tudo isto eu sei, mas já não posso explicar o que vejo. A ninguém. É isso: Estou sózinha no meio destas vozes alegres e razoáveis.
É isso então o que me espera? É preciso reagir, dizem-me; a ideia vai roendo, mas com lentidão e paciência.
Reli com melâncolia algumas notas, estou contente por ter dado com as minhas notas. Há dez anos que não as relia. A minha letra mudou, tenho a impressão: antes escrevia mais miudinho. Como eu gostava, que feliz que me sentia! Ria ìntimamente a pensar na cara que certamente fizera.
Não são os documentos que faltam: cartas, fragmentos de memórias, relatórios secretos, arquivos da p... . Não se contradizem, isso não, mas também não concordam; dir-se-ia que não se referem à mesma pessoa? Serei mais escrupulosa ou menos inteligente? Formulado assim, de resto, o problema deixa-me indiferente de todo. Afinal de que é que ando à procura? Não faço ideia. Mas agora.... é ao livro que me prendo, sinto uma necessidade cada vez mais forte - à medida que vou envelhecendo dir-se -ia.
É sempre tarde ou cedo para aquilo que queremos fazer. Um momento do dia, bem particular. Hoje então é intolerável. Fica apenas um grande rasto sobre mim. Quando eclipsa a lua eu deveria deitar-me.

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